BOAS VINDAS

"A física é para a vida" (Leonard Mlodnow)

sábado, 23 de novembro de 2013

Ciências

Renato Russo diz que "não saca nada de física, literatura, gramática... e que odeia química."

Odeio Química

Meire Pavão há anos disse que não sabe o que faz do latim. Dizia ela ainda: "Se a aritmética serve pra somar, se a gramática serve pra falar e a ginástica serve pra pular; ao professor vou perguntar o que eu faço do latim?"

O que faço do latim ?

A escola está tomada pelo "pra quê". As ciências que demandam cálculos a qualquer hora e por qualquer motivo então são alvejadas pelo "vírus do pra-quê". A física com seu MRU, MRUV, MHS, MCU, etc; a química com as reações e as regra de três que nunca acabam; a genética com suas demandas iniciais por estatística e probabilidade; a geografia com seus fusos horários; são campeãs do chamado "fracasso escolar".

Eu tenho uma teoria (mais uma) e desta vez sobre a tecnologia nos ambientes profissionais: hospitais recebem câmaras hiperbáricas, leitores de ondas cerebrais e operadores de ressonância magnética; escritórios recebem computadores mais eficientes; jornais melhoram seus aparatos fotográficos e digitais; até a polícia tem investimento em tecnologia criminal e forense. Por que as escolas, em especial as públicas, não recebem uma onda de acolhida da ciência e da tecnologia?



A resposta eu já sei e você, que pacientemente lê esta chatice também já sabe. O ponto que quero explorar aqui é outro: falamos em evasão estudantil na rede pública mas cadê a ciência e a tecnologia? Elas também evadiram das escolas? Onde elas foram parar?

Antes que as respostas venham clamando por investimentos (e por punição para aqueles que desviam verbas públicas por um crime tão hediondo), trago algumas soluções que chamarei de "tecnologias novas": Aprendi, com artistas, filósofos, poetas, cineastas, provadores de vinho e, eventualmente, com alguns professores de física,  a colocar o "dedo na ferida" e procurar por alguma coisa viva dentro dos estudantes que possa inflamar o espírito científico.

Explico-me: Rubem Alves contou em um de seus livros que a teoria dos germes serviu para instruir a classe médica antes que os germes fossem descobertos. Sendo assim, o simples desconfiar fez com que médicos lavassem as mãos, usassem luvas e trocassem as ataduras com mais celeridade e presteza. Não demorou e o número de pacientes mortos diminuiu. Adoro contar essa história dentro das salas de aula e ver, na maioria delas, braços se levantarem fazendo perguntas sobre as ciências.

O filme "De volta para o futuro - parte 2" mostra um menino que, por capricho, compra uma revista de apostas no futuro e volta ao passado para ganhar essas apostas. Quando este caderno passa de mão em mão, o passado começa a se alterar e, com ele, o futuro, e de maneira brusca, como num passe de mágica. Ao introduzir o filme em sala de aula, penso com os alunos se isso poderia acontecer dessa maneira ou se "o futuro deveria mudar de forma mais branda e processual". Não demora muito e algum feliz ouvinte das minhas aulas lisérgicas levanta a mão e pergunta: "Mas pssôr!!!!.... então o que é o tempo?"



Minha felicidade vem com o erguer a dúvida e não com a resposta, muito menos com a resposta certa. A dúvida é a coisa mais buscada pela pesquisa científica em ambientes universitários. Ela deveria ser idolatrada. Ela pode chamar o aluno de volta para as ciências. As tecnologias baratas provocam esse "chamar" com algum conforto. Não são necessários computadores de última geração para chegar ao limiar da física em sala de aula. O exemplo do filme que dou ilustra um ponto: até hoje nenhum físico sabe "o que é o tempo" e mesmo assim é possível discutir o assunto com alguma propriedade no ensino médio.

Fica o assunto aqui para provocar e não para ser encerrado. Bom pensarmos que as feridas educacionais estão abertas e que não precisamos de microscópios para descobrir que elas existem. Dentre nós, professores, alguns querem a cura, outros querem expô-las mais. Não sei se faço, através deste canal, algo bom mas gostaria de limpar os germes sem mesmo saber tanto sobre eles como deveria.

Um pensamento: Lápis e cadernos também são uma forma de tecnologia. Depois de Guttemberg, livros também o são.


Algo mais sobre ciências que escuto e que me ajudou a escrever este monocórdio:  http://www.universitariafm.ufes.br/programas/nas-ondas-da-filosofia

2 comentários:

Ana Dilza disse...

Lindo texto, Fab! Concordo que a dúvida é um dos dons mais preciosos, e que que deve sempre haver estímulo ao pensamento crítico.
Ana

Unknown disse...

Foi direto ao ponto: os educadores de hoje ainda temem a dúvida. Muitos se escondem atrás de seu pretenso conhecimento e paralisam qualquer evolução (sua e dos alunos) com a censura da dúvida.